segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Os intertextos do filme Narradores de Javé

Quando assistimos ao filme Narradores de Javé discutimos a questão do papel da escrita na sociedade. Os personagens se sentiam importantes em registrar sua históia naquele livro, pois na verdade era sua identidade que ia ali, seus antepassados, sua história. Era um texto científico e esse gênero nos remete a algo de muito valor social, uma vez que a históia só existe a partir da escrita, antes disso é só pré-história, como eu escrevi no relato sobre a visita à exposição Lusa - a matriz portuguesa. No entanto, o pesonagem de Antônio Biá foi excluído justamente por ser o únco a dominar a escrita na cidade. Com isso podemos dizer que a escrita só assume seu real valor numa comunidade, quando ela possui uma função social.
Além de discutirmos o papel da escrita, também levantamos muitos intertextos preentes na história. Um cursista comparou o filme com a história de um personagem famoso de São Sebastião, o Tião Areia, o qual é um senhor que ainda vive na cidade a qual possui uma praça que recebeu seu nome, pois é um dos moradores mais antigos. Ela ressaltou que na administração, nos documentos da história da cidade, não há nada registrado a seu respeito.

No filme há a presença de personagens (reais e fictícios) de outras histórias e contos, como a do herói medieal em seu cavalo branco, a do herói negro Zumbi dos Palmares, inclusive há uma cena em que aparece um quilombo. Também aparece a figura de Lampião ou outro herói sertanejo, como Idalécio e Maria Bonita como Maria Dina, representando a mulher sertaneja, a qual tem traços marcantes de amante e guerreira.
Características de contos fantásticos também são presentes na obra. As visões de Antônio Biá e as profecias de Maria Dina. Um símbolo que sempre aparece nos sonhos de Antônio Biá é a vela, a qual sabemos ter vários significados, a fé, esperança, luz, doação legítima a partir de sua auto destruição, na qual ela se consome para iluminar os caminhos, ou mesmo a simbologia do sagrado. E junto com a vela aparece a água, a inundação, na qual é o terror de todos os moradaores de Javé. O livro deve ser escrito para que se evite a inundação da cidade e consequentemente seu fim.

Os cursistas compararam a obra ainda com o livro de João Cabral de Melo Neto, Morte e vida Severina. O cursista Cido comparou o personagem de Biá ao Macunaíma, pois o primeiro tem características de um anti-herói, é considerado por todos o salvador, mas não consegue cumprir tal tarefa, sendo que também não é o vilão, e sim é mais uma vítima de um sistema que prioriza os interesses de uma minoria privilegiada. Biá também pode ser comparado à figura do malando João Grilo.

O filme apresenta um belo ensaio sobre a linguagem e sua ludicidade, na maneira do protagonista brincar com o ato de escrever e ao poetizar a respeito do papel e da tinta. Os seus escritos na parede, os poemas que faz, isso tudo mostra a relação dele com a escrita, sua defesa por uma língua que liberta e não que aprisiona. E ao final, quando ele faz aquele discurso aos conterrâneos, mostra-nos que mesmo essa competência lingüística, a qual nenhum outro morador daquela comunidade possui, não é o bastante para que permaneçam em suas casas. Isso mostra o diálogo que a obra faz com a teoria da Sociolingüística, pois segundo Bagno, no que concerne ao preconceito lingüístico, o importante não é o que se fala nem tampouco o como se fala, mas sim quem fala. Pois ele deixa claro em seu discurso que o povo estava agindo com muita ingenuidade ao achar que a escrita de um livro acabaria com um interesse político, aliás, que a história de Javé pudesse importar a alguém. Aquelas pessoas, infelizmente ainda, para a nossa sociedade, assim como chamou Biá, não passavam de um nada, de um povo anfíbio.

4 comentários:

Silas de Brito disse...

Amei seu post, Clotilde!
Estou totalmente curiosidade em relação ao filme citado!
vlw por compartilhar!

Pat Vieira disse...

Também não vi esse filme...

Dam disse...

Adorei seu post. Também dei muita importância aos pontos que você citou aqui quando assisti a primeira vez.

KàH Prates disse...

Muito legal seu post.
O filme realmente encanta e os pontos que você abordou foram muito interessantes.
É bom saber que têm pessoas com a visão que vc tem!

Obrigada por compartilhar!